Nova Lei de Licitações e a sua concorrência “pregonizada”

Não. A Nova Lei de Licitações não criou uma nova modalidade de licitação chamada de “Concorrência Pregonizada”.

O que ela fez foi “pregonizar” a já conhecida modalidade de concorrência. Explicarei o que isso quer dizer.

A Nova Lei de Licitação é o cume de uma tendência que já se mostrava bastante evidente nas últimas legislações a respeito de licitações e contratações públicas, a exemplo da Lei 12.462/11 (Lei do Regime Diferenciado de Contratações Públicas) e Lei 13.303/16 (Lei das Estatais), o que chamaremos, para fins deste texto, de “pregonização”.

Tal “pregonização”[1], no novo diploma, tem cinco notas características.

A primeira delas consiste no fato de a fase de julgamento (classificação das propostas) vir antes da fase de habilitação. Ou seja, primeiro abre-se/disputa-se o preço. Depois, analisa-se os documentos apenas do vencedor provisório (art. 17).

A segunda delas é a possibilidade de o orçamento estimado da contratação, mesmo na concorrência, ter caráter sigiloso até a conclusão da fase de julgamento de propostas (art. 24, Nova Lei). Tal sigilo não será aceitável quando o critério de julgamento adotado for o “maior desconto” (art. 24, parágrafo único). Atualmente, apenas no pregão se admite a possibilidade de não-divulgação do orçamento estimado como anexo obrigatório do instrumento convocatório[2].

A terceira nota característica consiste na possibilidade de haver, na modalidade de concorrência, disputa aberta (lances públicos) e/ou fechada (proposta no envelope), nos termos do Art. 55.

Inclusive, poderá haver negociação com o vencedor do certame (art. 60[3]), o que, também, é uma característica marcante, hoje, da modalidade licitatória do pregão. Por isso, essa seria uma quarta nota característica da “pregonização” da concorrência.

A quinta dessas notas características, que é consequência da primeira, consubstancia-se na existência de uma fase recursal única. Isso significa que questões relativas à classificação das propostas e à habilitação serão ventiladas e apreciadas em um único recurso, após a fase de habilitação. Agora, portanto, a regra é, primeiro, julgamento, depois, habilitação.

A Nova Lei permite, ainda assim, a inversão de fase. Mas, cuidado, a inversão aqui é para voltar tudo ao “normal”, como é hoje: primeiro a habilitação, depois o julgamento. Para que isso possa ocorrer, é necessária a edição de “ato motivado com explicitação dos benefícios decorrentes”, nos termos do art. 17, §1º, da novel legislação.

Se você chegou até esta altura do artigo, com certeza, está se perguntando qual é a diferença entre o pregão e a concorrência na nova lei. Não seriam tais modalidades a mesma coisa?

O rito procedimental será o mesmo, como expressamente estabelece o art. 29, mas as modalidades continuam diferentes entre si.

O pregão será destinado a aquisição/contratações de bens e serviços cujo objeto “possuir padrões de desempenho e qualidade que possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado” (art. 29), ou seja, objetos comuns. A concorrência é destinada aos demais serviços, como os técnicos-especializados e predominantemente intelectuais.

E mais, o pregão só poderá se utilizar dos critérios de julgamento do “menor preço” ou do “maior desconto” (art. 6º, XLI). A concorrência terá mais liberdade na utilização dos critérios de julgamento (art. 6º, XXXVIII), podendo fazer uso dos seguintes: “menor preço”, “melhor técnica ou conteúdo artístico”, “técnica e preço”, “maior retorno economico” ou “maior desconto”.

Antes de encerrar este texto, vale destacar, ainda, uma outra novidade nas licitações da Nova Lei: as licitações serão realizadas, preferentemente, na forma eletrônica (art. 17, §2º).

 A realização presencial será excepcional (termo utilizado pelo próprio Legislador) e, como tal, deverá ser motivada. Além disso, a licitação presencial deverá ser, obrigatoriamente, gravada em aúdio e vídeo, com a posterior juntada da gravação nos autos do processo licitatório (art. 17, §5º).

Notem que os esforços do Legislador foram direcionados para uma maior transparência do processo licitatório e, sobretudo, para criar mais mecanismo para atingimento do resultado mais vantajoso à Administração.

Artigo por Gustavo Costa Ferreira. Escritor e fundador do blog Advogado no Controle. Mestre em Direito pela UFSC. Advogado especialista em Licitações e Contratações Públicas, Saneamento Básico e Direito Administrativo Sancionador.

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[1] O art. 29, da Nova Lei de Licitações, deixa claro que a concorrência e o pregão “seguem o rito procedimental comum a que se refere o art. 17, desta Lei”: Art. 29. A concorrência e o pregão seguem o rito procedimental comum a que se refere o art. 17 desta Lei, adotando-se o pregão sempre que o objeto possuir padrões de desempenho e qualidade que possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado. Parágrafo único. O pregão não se aplica às contratações de serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual e de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços de engenharia de que trata a alínea a do inciso XXI do caput do art. 6º desta Lei.

[2] A jurisprudência do Tribunal de Contas da União é sedimentada nesse sentido: No caso do pregão, a divulgação do valor orçado e, se for o caso, do preço máximo, caso este tenha sido fixado, é meramente facultativa. Acórdão 392/2011-Plenário | Relator: JOSÉ JORGE. Publicado:  – Informativo de Licitações e Contratos nº 51; Na modalidade pregão, o orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários não constitui um dos elementos obrigatórios do edital, devendo estar inserido obrigatoriamente no bojo do processo administrativo relativo ao certame. Acórdão 394/2009-Plenário | Relator: JOSÉ JORGE; Na modalidade pregão, o orçamento estimado não constitui elemento obrigatório do edital, devendo, contudo, estar inserido no processo relativo ao certame. Todavia, sempre que o preço de referência for utilizado como critério de aceitabilidade da proposta, a sua divulgação no edital é obrigatória, nos termos do art. 40, inciso X, da Lei 8.666/1993. Acórdão 2166/2014-Plenário | Relator: AUGUSTO SHERMAN. Publicado:  – Informativo de Licitações e Contratos nº 211 – Boletim de Jurisprudência nº 51 de 01/09/2014;   Nos pregões para aquisição de medicamentos, a divulgação dos preços estimados da contratação no edital do certame prejudica a obtenção da proposta mais vantajosa para a Administração. Acórdão 903/2019-Plenário | Relator: AUGUSTO NARDES; A disponibilização, em pregão eletrônico, dos preços unitários e global estimados apenas após a fase de lances – e não no edital do certame – encontra amparo na legislação vigente. Acórdão 2080/2012-Plenário | Relator: JOSÉ JORGE – Informativo de Licitações e Contratos nº 118

[3] Art. 60. Definido o resultado do julgamento, a Administração poderá negociar condições mais vantajosas com o primeiro colocado. § 1º A negociação poderá ser feita com os demais licitantes, segundo a ordem de classificação inicialmente estabelecida, quando o primeiro colocado, em determinado momento, mesmo após a negociação, for desclassificado por sua proposta permanecer acima do preço máximo definido pela Administração. § 2º A negociação será conduzida por agente de contratação ou comissão de contratação, na forma de regulamento, e, depois de concluída, terá seu resultado divulgado a todos os licitantes e anexado aos autos do processo licitatório.

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